domingo, 11 de maio de 2008

Não é bem assim


"O Brasil é maior do que sua mídia, do que sua imprensa. Maior do que São Paulo, Rio, Brasília. Maior do que PT e PSDB. Maior do que Lula, Dilma, Agripino e dossiê. Mas continua um gigante sonolento quando quem sofre é o pobre, a periferia. Acorda, Brasil!".

Retirei este trecho da coluna de hoje de Eliane Catanhêde, publicada na Folha de S.Paulo (aqui, para assinantes).

Tentei evitar ao máximo tratar do já desgastado caso da menina que voou de seu confortável quarto de classe média em São Paulo para as primeiras páginas de todos os jornais do páis. Mas Eliane toca num assunto que já vi muitos comentarem: isso acontece todo dia no Brasil, mas só é divulgado quando se dá em tetos estruturados, acima de qualquer suspeita, causando uma comoção profunda no coração das gentes que pensam que o mundo é uma Disneylândia.

Concordo em parte com o argumento. Explico. É mais fácil achar razões para o absurdo quando um pai drogado, semianalfabeto e desempregado arremessa seu bebê de 11 meses na parede em decorrência de uma crise aguda causada pela abstinência de drogas do que quando um casal supostamente estruturado bate, estrangula e joga sua filha de cinco anos pela janela, segundo o inquérito policial.

A barbárie se torna mais chocante à medida que menos razões existam para que ela aconteça. O vôo de Isabela, em minha opinião, guarda uma maior relevância jornalística que o primeiro justamente por isso. Daí a compactuar com o espetáculo montado em torno do crime são outros quinhentos.

Porém, caso eu fosse editor de um jornal, não teria dúvidas que o alto da primeira página seria reservado ao caso Isabela. É imprescindível deixar claro que, penso eu, ambos acontecimentos mereçam ser noticiados pela mídia e debatidos pela sociedade. São duas atrocidades que têm "relevância na pele lisa da história", de acordo com o velho chavão aprendido na faculade de jornalismo para classificar o que é notícia ou não.

O que não concordo é que o jornalismo seja explicado pura e simplesmente pela tese rasteira de que quando a elite é espinhada, a imprensa se preocupa. Quando os afetados são os desdentados, a mídia vira as costas e vai tomar sorvete na pracinha. Em parte isso acontece, mas nem sempre.

Muitos veículos sérios cobriram a morte de Isabela de maneira correta. E estes mesmos veículos também cobrem chacinas em favelas, prisões indevidas de indivíduos 2P (preto e pobre), mortes em filas de hospitais e por aí vai.

Reforço meu argumento. Não é salutar tratar a imprensa de maneira generalista, colocando todos no mesmo saco. Nenhum setor age de maneira uniforme, muito a menos a mídia. Assim como em todas as áreas, temos no jornalismo exemplos bons e ruins. Devemos é desenvolver um filtro que nos indique os caminhos da imprensa de alto padrão.

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