quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

Um Planeta Desgovernado



África. Um continente jogado às traças, mergulhado em guerras e totalmente apartado do desenvolvimento material de nossa era. Suas crianças padecem com as bocas escancaradas à espera de migalhas, ou então são utilizadas como soldados e morrem sem vivenciar as fantasias inerentes à infância. Suas mulheres são violentadas por combatentes, obrigadas a viverem num ambiente de violência, desesperança e miséria. A elas é negado o direito de receberem flores. Quase um terço de sua população adulta é portadora do HIV, fato que coloca a espada sobre a cabeça de milhões. Não há remédios, não há assistência, não há paz, não há vida num lugar assim.

Iraque. Um país destroçado por uma invasão em nome da democracia e dos direitos supremos do homem. A semente democrática não floresceu e o único direito lá existente é morrer repentinamente vítima de um atentado terrorista. A guerra civil é uma verdade tão concreta quanto o metal das balas que cortam os ares. Novamente as crianças são as mais prejudicadas, envoltas em calamidades das quais não são responsáveis. Por lá, a única escola que funciona é aquela que ensina o manuseio de rifles e prepara sua juventude para a morte em nome da fé.

Coréia do Norte. Um país diminuto, governado por um déspota megalomaníaco que em nome de suas convicções subjuga toda uma população, leva-a ao encontro da fome, da pobreza, do obscurantismo intelectual, da âncora que os arrasta rumo às profundezas do breu. Além disso, um país vocacionado para o conflito, até mesmo nuclear.

Irã. Uma nação islâmica fundamentalista que regride aos tempos das trevas. Financiadora de entidades terroristas, disposta a se valer de armas atômicas para defender seus interesses, castradora de liberdades mínimas do ser, intransigente na luta pela implantação de um mundo guiado pelos preceitos de sua religião. Um espinho venenoso cravado no seio da paz e da conciliação humana global.

Venezuela. Um país inundando pelo petróleo, governado por um louco que em seus íntimos desejos guarda a vontade de ser um pop star, tamanha voracidade que possui pelas câmeras. Um governo que ludibria sua população com políticas ocas e inconsistentes, graças aos rios de dólares provenientes da atual alta dos preços do ouro negro. Um país que caminha a passos largos para a ditadura, que traz consigo a censura, a perseguição política, a tortura, a proibição do pensar. E a Venezuela começa a fazer escola na América Latina, vide o Equador, que passou a caminhar de mãos dadas à Chávez.

Estados Unidos. Uma potência histérica, paranóica, arrogante, alienada e beligerante. Sua população é dada ao consumo desenfreado, à valorização excessiva do ter em detrimento do saber, do ser. Um dos principais responsáveis pela atual onda de pessimismo quanto à catástrofe ambiental que se avizinha. Uma nação acéfala, que nada em riqueza e se afoga nas águas da onipotência. O principal ator em conflitos mundo afora, e pior, o iniciador de vários deles.

Brasil. A terra prometida, o país que não foi, não é e aguarda placidamente a boa ventura do futuro. Um lugar onde a violência encontrou seu ninho, a pobreza fez morada e a corrupção é endêmica. Um país que chama a covardia e a passividade de cordialidade, que trata com desleixo o maior celeiro natural do mundo, que rasga sua constituição, que se nega a enfrentar seus problemas primordiais. Um país que instala suas gerações futuras na caserna da mediocridade, da não-possibilidade. Um Estado que se mobiliza mais por uma festividade nacional, como o carnaval, ou por uma competição esportiva, como a Copa do Mundo, do que por suas necessidades sociais mais urgentes.

Não há muito que se comemorar, e há muito com que se preocupar. Parafraseando a música: “E ainda pode se encontrar quem acredite no futuro”.

quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

O Homen Adestrado


Dois animais. Um bípede, o outro quadrúpede. Um fala, o outro late. Um dá socos e pontapés, o outro morde.

Estão ali, parados, o cão e o homem, um preso em sua coleira de couro, o outro em sua coleira de idéias. O que o indivíduo tenta é adestrar os instintos originais do cachorro, fazer com que este siga prontamente suas ordens, pronunciadas em ríspidas monossilábicas. Cumprida a tarefa, o cão recebe uma gratificação e é arrebatado por um furor momentâneo.

A cada êxito, o amestrador deixa resplandecer em sua face uma alegria incontida, um orgulho vistoso, como se o mundo subitamente houvesse se rendido aos seus comandos. O sentimento de poder realmente embriaga, a condição de ditar entorpece.

Em um momento, por mais que o homem goste do cachorro, ou pense que goste, e trate-o de maneira digna, ele o rebaixa, o menospreza, o inferioriza. É o poder da técnica triunfando sobre a natureza. Bastaria um ataque para que o cão, que não era dos pequenos, estraçalhasse a carne de seu inquisidor. Mas não, em troca de uma recompensa das mais fugazes e, importante, devido também a uma vara, ele se submete.

Caso o cachorro, cujo nome era Tod, esboçasse a menor reação contrária, era ofendido por esta vara, não um galho qualquer, mas sim uma daquelas produzidas em escala industrial, manufaturadas exclusivamente para a punição. E desconfio que Tod era bem esperto, pois não foram necessários mais que dois ou três golpes para que ele seguisse resolutamente as ordens do “líder”. Ou seja, além de não apanhar ainda receberia um prêmio, situação bem mais vantajosa, não acham?

Está transcrito acima um cenário onde interagem um cachorro e um homem. Aparentemente nada demais. Com um pouco de imaginação, comparem agora esta situação ao que se passa em nosso mundo, em nossa sociedade, na relação entre os homens. Em minha irrelevante opinião, a semelhança chega a ser sombria.

Realmente é necessário pensar em que mundo vivemos, o que queremos e o que podemos fazer para aperfeiçoá-lo, porque já habitamos as bordas do insustentável.

Não se deixem dominar por sensações rasas que evaporam-se de suas memórias tão rápidas quanto um flash, não coloquem seus espíritos à venda!